Manifesto contra a extinção da Fundação Florestal e em defesa da natureza, do bem-estar humano e das unidades de conservação, sob responsabilidade do Governo do Estado de São Paulo
Surpreendidos pela declaração de autoridade do Governo do Estado de São Paulo sobre a proposta de extinção da Fundação Florestal, vinculada à Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente , nos manifestamos em defesa da natureza, do bem-estar humano e das unidades de conservação, sob responsabilidade do governo do estado, e contra a extinção da Fundação Florestal e pelo seu fortalecimento.
Reconhecemos a melhor capacidade de uma instituição da administração indireta para gestão das áreas protegidas e a importância das múltiplas parcerias, inclusive com empresas, instituições científicas, comunidades locais e tradicionais etc., e defendemos uma equipe própria e a instituição fortalecidas.

A surpresa com o anúncio neste momento crucial

Causa espanto que o estado mais rico do país esteja considerando a possibilidade de seguir um caminho contrário à conservação da natureza – o que pioraria a imagem do Brasil (e de São Paulo) junto às comunidades nacional e internacional.
Mais surpresos ainda estamos por isso ocorrer em momento crucial para evitar aprofundar a crise mundial do clima e da biodiversidade, quando a Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES) demonstra que temos cerca de um milhão de espécies ameaçadas e cerca de 2/3 dos habitats naturais comprometidos pelo mundo. Com a Plataforma Brasileira (BPBES) confirmando situação difícil também no Brasil, mas com importante potencial aliando conservação, ciência e inovação no apoio ao desenvolvimento sustentável.
Vivemos um momento quando a ciência cobra mais e melhores áreas protegidas, ao nos aproximarmos da 15ª Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade, quando a América Latina declara a importância de ampliar os esforços pelas áreas protegidas e pela humanidade e quando o próprio Estado de São Paulo, como entidade governamental subnacional, declara engajamento em um novo, e mais ambicioso, acordo global pela natureza e pelas pessoas.
Num momento que todos sofrem os imensos impactos sociais e econômicos da pandemia da covid-19, que tem origem na degradação da natureza e poucos cuidados com a vida silvestre, destacamos os estudos recentes que têm demonstrado que a proteção da natureza e o controle do tráfico ilegal da vida silvestre tem um custo estimado entre 100 e mil vezes menor que os impactos econômicos causados por esta pandemia.

A importância das áreas protegidas

Sabemos que a natureza faz bem! Bem conservada ela traz inúmeros benefícios ao bem-estar e à saúde humana, contribui para o ar limpo, para a vazão e a qualidade das águas para diversos fins (inclusive abastecimento humano, hidrelétricas, agropecuária e desenvolvimento econômico em geral), para a redução dos impactos dos desastres provenientes das manifestações climáticas (salvando vidas e viabilizando o fluxo de bens e serviços que apoiam a boa economia), para manutenção dos microclimas, para desenvolvimento do turismo sustentável e presta muitos outros serviços dos ecossistemas. Cada vez mais a ciência comprova que a interação com a natureza propicia melhor saúde aos coletivos humanos.
Nos espaços onde a natureza, os seus ecossistemas e espécies e os valores culturais são protegidos, as atividades econômicas são favorecidas, por meio do turismo e do uso sustentável dos recursos naturais, entre outros meios. O investimento nas áreas protegidas gera movimento positivo na economia. Estudos brasileiros mostram que há uma relação benéfica econômica de 1:15 – pois, a cada Real investido em unidades de conservação, R$ 15,00 (quinze reais) são gerados para a economia, sobretudo no âmbito local (onde muitas vezes não há outras opções ou há a necessidade de atividades complementares). “’A contribuição das unidades de conservação para o desenvolvimento econômico e social é considerável, com retornos muito superiores aos valores investidos na sua gestão.’ As unidades de conservação movimentam ou representam valores econômicos entre R$ 67 e 76 bilhões anuais e promovem muito mais de 300 mil ocupações de trabalho – considerando apenas o relativamente pouco que é possível contabilizar hoje em dia” – demonstram outros estudos brasileiros publicados.
Considerando as unidades de conservação paulistas como patrimônio de todos, é responsabilidade do Governo do Estado de São Paulo, por meio da sua Fundação Florestal, defender ativos com valores que podem alcançar a cifras de R$ 90 milhões em carbono equivalente estocado.
A natureza bem conservada, principalmente em áreas protegidas, presta uma gama importante de serviços ecossistêmicos, de provisão, de regulação, culturais-espirituais, entre outros que melhoram significativamente a qualidade de vida da sociedade e que sustentam ao menos metade do PIB nacional e paulista.
Considerando os serviços prestados pela natureza, se bem conservada, destacamos que o direito aos benefícios da natureza é um direito humano fundamental (da terceira geração). Os sistemas de unidades de conservação e outras áreas protegidas devem ser geridos com vistas à equidade, à redução das desigualdades, no campo e na cidade.
As unidades de conservação são ainda palco de pesquisa científica, permitindo o avanço do conhecimento sobre a composição, estrutura e funcionamento de ecossistemas nativos, o que é imprescindível para a adequada conservação, restauração e uso sustentável da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos. A atuação de institutos de pesquisa e universidades nas unidades de conservação e a sua integração com a Fundação Florestal reforçam o conhecimento e o valor do que é protegido nestas áreas. Em particular, a parceria de pesquisadores do Programa Biota, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), com a Fundação Florestal vem permitindo aperfeiçoar cada vez mais a sua gestão.

As unidades de conservação – obrigação constitucional

Em bom alinhamento com as diretrizes técnicas internacionais e os principais acordos globais, as unidades de conservação, no Brasil, são definidas pela lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Snuc; Lei Nacional nº 9.985, de 2000), como:
“espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção”.
Elas são o principal instrumento para a proteção da natureza e dos valores culturais associados, no Brasil, atendendo o definido em nossa Constituição Brasileira de 198816:
“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: [...] III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção [...]”.
Essa responsabilidade da defesa do meio ambiente e da natureza, junto com a sociedade, não é só da União, mas também dos estados brasileiros, tendo sido reafirmada pela Constituição do Estado de São Paulo, de 1989. As unidades de conservação e outras áreas protegidas do Estado de São Paulo O Estado de São Paulo, com histórico protagonismo local e nacional (e relativa boa imagem internacional), tem responsabilidade de gestão direta sobre 130 unidades de conservação, sendo 102 sob gestão direta da Fundação Florestal (FF-SP), com cerca de 4,6 milhões de hectares, além do reconhecimento de 56 reservas privadas (RPPNs), pelo Estado de São Paulo, por meio da Fundação Florestal, com mais de 17 mil hectares. 20 Elas são dedicadas à conservação da biodiversidade, à visitação, à educação ambiental, à pesquisa, ao uso sustentável pelos povos e comunidades tradicionais e à manutenção de outros serviços dos ecossistemas.
As demais unidades de conservação são geridas pelo Instituto Florestal e pelo Instituto de Botânica, ambos pertencentes à Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente do Estado. Com relação a outras áreas protegidas, vale destacar mais estações experimentais, nas quais são desenvolvidas pesquisas e manejo de produtos florestais e que mereceriam uma consideração cuidadosa para serem transformadas em parques estaduais ou florestas estaduais, pelo seu valor ecológico, paisagístico, científico ou turístico – particularmente em casos do interior do estado e do cerrado paulista, com menor cobertura de unidades de conservação.

A Fundação Florestal e a gestão das unidades de conservação

A Fundação Florestal foi criada em 1986 para apoiar a gestão das áreas protegidas e da produção científica do Estado de São Paulo, por meio da comercialização de produtos florestais e promoção de outros ingressos. Desde sua criação, a ela coube a responsabilidade de gerir a Fazenda Intervales, posteriormente definida como parque estadual, representando um dos principais núcleos de Mata Atlântica mais bem preservados do Brasil. A partir de 2006, com o Decreto Estadual nº 51.453, é criado o Sistema Estadual de Florestas (Sieflor) de São Paulo, ajustado pelo Decreto Estadual nº 54.079, de 200925, e a Fundação Florestal passa então administrar a maior parte das unidades de conservação do Estado. Em 2014 as diretrizes de conservação da natureza e gestão de áreas protegidas são fortalecidas no Estado de São Paulo, com o estabelecimento do Sistema de Informação e Gestão de Áreas Protegidas e de Interesse Ambiental (Sigap), por meio do Decreto Estadual nº 60.30226, confirmando um dos mais importantes sistemas estaduais de áreas protegidas do Brasil. “A principal missão da Fundação Florestal é a conservação da biodiversidade e dos recursos naturais na atualidade e para as futuras gerações. Qualidade ambiental é sinônimo de saúde e de qualidade de vida e, cada vez mais, a sociedade vem ganhando essa consciência coletiva.”
A gestão das unidades de conservação por instituição pública da administração indireta vem demonstrando, em todos os níveis, e em vários exemplos internacionais, resultados muito mais positivos do que quando geridos pela administração direta. Compete ao respectivo governo, de forma direta, definir políticas públicas e diretrizes da conservação da natureza, do uso sustentável da biodiversidade e de defesa dos valores culturais associados. Todavia, é muito mais adequado que instituição pública da administração indireta faça a gestão das áreas protegidas, de forma direta, com relativa maior flexibilidade e agilidade, pois isso implica em intensos e múltiplos processos de aquisição, contratação etc. Ambas, administração direta e indireta, devem, no entanto, seguir a Constituição Brasileira, a Constituição do Estado de São Paulo, a Lei do Snuc, o Decreto do Sigap e legislação associada.
O caminho encontrado pelo Estado de São Paulo, com a criação da Fundação Florestal, do Sistema Estadual de Florestas e do Sistema de Informação e Gestão de Áreas Protegidas e de Interesse Ambiental continua em processo de melhoria. Nesse sentido, a Fundação Florestal do Estado de São Paulo vem demonstrando ao longo dos anos progressivo sucesso nessa capacidade de gestão, inclusive no estabelecimento de parcerias e geração de receita. Muito embora seja necessário o reconhecimento de debilidades e a necessidade do fortalecimento da instituição e do seu corpo de servidores.
Vale destacar, entre outras tantas ações, a redução dos desmatamentos no estado, segundo dados apresentados nesse primeiro semestre de 2020 pelo Instituto Florestal e Fundação SOS Mata Atlântica, além do MapBiomas.
A atual pandemia obrigou a suspensão de várias atividades, notadamente as de visitação (uso público) e de pesquisa em campo. Antes disso, entre 50 e 110 mil visitantes por mês foram registrados nos primeiros meses de 2020 nas diversas unidades de conservação do Estado de São Paulo. Desde antes, inclusive anos anteriores, e mesmo durante a pandemia, passos concretos vêm sendo dados para a melhoria da visitação, atendendo a funções de servir a sociedade – como acessibilidade para portadores de necessidades especiais, ingressos pela internet, contratos de permissão ou autorização de uso como estratégia de incentivo à visitação e ao envolvimento social na gestão com geração de renda para as populações locais, inclusive indígenas, preparação de novos roteiros e atrativos e planos de uso público de roteiros específicos (130, em 47 unidades de conservação), gestão dos impactos da visitação, programa de parcerias e patrocínio com a iniciativa privada, entre outros. Nesse sentido, as ações da Fundação Florestal coadunam com as premissas de ecoturismo do Brasil e da Declaração de Quebec, de 2002, sobre os princípios do ecoturismo.
Com relação à proteção dos recursos naturais, no primeiro semestre de 2020, mesmo com a pandemia, foram registradas mais de 4.300 ações preventivas e 482 ocorrências de fiscalização nas unidades de conservação. Houve também 176 pessoas foram envolvidas no combate a incêndios. Quase 15 mil pessoas foram atendidas presencialmente em atividades de educação ambiental, além de 128 mil interações não presenciais. 99% das unidades de conservação têm conselhos de apoio à gestão ativos.
Os recursos financeiros nesse primeiro semestre de 2020 foram pouco mais de R$ 174 milhões, dos quais apenas 30% (pouco mais de R$ 52 milhões, incluindo 38 milhões para custos de pessoal) vieram do Tesouro do Estado de São Paulo – sendo o restante composto por projetos, compensação ambiental e receita própria. Estes valores permitem ganhos para a sociedade paulista superiores a 15 vezes o investimento e à manutenção de milhares de postos de trabalho bem distribuídos. E são praticamente nulos frentes às projeções de necessidade de redução de déficit do Governo do Estado.
Em paralelo, em apoio e em integração com a Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente, tem havido a promoção internacional da qualidade ambiental no estado, respaldada também pela constante melhoria na gestão das unidades de conservação estaduais, com benefícios à imagem do estado que poderiam ser revertidos.

Futuro esperado e responsabilidades

Ainda em 2020, várias novas reservas privadas (as RPPNs, reservas particulares do patrimônio natural) foram reconhecidas. Além disso, novas unidades de conservação de gestão pública foram propostas – com destaque para a proposta do Monumento Natural Estadual Mantiqueira Paulista, já recentemente aprovada pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema), e cujo decreto de criação é aguardado para breve. Outras encontram-se em estudo, como as unidades de conservação do sudoeste paulista fortemente esperadas. Concluímos que o Estado de São Paulo, enquanto guardião dos maiores e mais contínuos remanescentes da Mata Atlântica, segundo maior bioma florestal do Brasil e o mais devastado bioma do país, de trechos de Cerrado ameaçados em alto grau e da importante biodiversidade costeira e marinha em suas costas, tem uma responsabilidade intransferível de zelar pela boa gestão de suas unidades de conservação – principal razão de ser da Fundação Florestal de São Paulo.
Dessa forma, nos manifestamos, em defesa das unidades de conservação e outras áreas protegidas no Estado de São Paulo e pela manutenção e fortalecimento da sua Fundação Florestal como sua entidade gestora.
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Veja aqui a versão completa do Manifesto (versão 1 - enviada em 11 de agosto de 2020) - https://bit.ly/33PdPd5
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